Somos seres gregários e
precisamos dos outros para ter vantagem evolutiva. Os sentimentos humanos, na
verdade, são desenhados evolutivamente. Desde que o humano é humano, a sua
tendência é a sobrevivência. Isso é um instinto básico. Somos moldados por ele.
Nossa consciência só cria as histórias, a maior parte das vezes repletas com
enredos românticos.
Oferecer ajuda aos outros para
que sejam ocasionalmente retribuídos é o que podemos chamar de “altruísmo
recíproco”. Esse termo foi cunhado pelo biólogo evolucionista, Robert Trivers.
Ele propôs que a motivação para agir com clemência em relação aos outros com os
quais não compartilhamos nenhum gene está na capacidade de adaptação, pois
existe uma boa chance de que, em algum momento no futuro, esses outros
retribuam a nossa benevolência. É assim que uma sociedade sobrevive, porque é
dessa maneira que ela consegue ter vantagem evolutiva.
Antes de Trivers, Charles
Darwin (1809-1883) também já propunha em seu livro, “A descendência do homem, e
seleção em relação ao sexo”, que à medida que a capacidade de raciocínio e
previsão se aperfeiçoa os homens não tardam a aprender por experiência que se
ajudarem seus iguais, normalmente receberão ajuda em retribuição.
Portanto, esse é um argumento
antigo. É interessante pensar que a cobrança da colega de igreja da senhora esteja
fundamentada numa ilusão de que as pessoas devem fazer ações incondicionais.
Isso é uma mera ideia, porque na prática não é bem assim que acontece. Agimos
benevolentemente sem que tenhamos consciência de que no fundo queremos algo em
troca, queremos proteção. É muito fácil dizer que nossas ações são puras, para parecermos
bons, principalmente quando não estamos precisando dos outros. Porém, ao fazermos
algo bom para o próximo, esperamos sim, uma retribuição, nem que seja um
simples agradecimento.
Por isso, não raro, escutamos
as pessoas reclamando:
· Fiz tudo por ele e, quando precisei, ele nem me
procurou para perguntar se eu queria alguma coisa;
·
Depois de tanto trabalho, ela não me disse nada;
·
Fui ao enterro do pai dele e agora ele nem
apareceu no enterro da minha mãe;
·
Fiz tudo o que podia para ajudar aquela família
e eles nem me agradeceram;
·
Eu fiz porque quis fazer, mas ela poderia ter
pelo menos um gesto de gentileza;
Quando alguém reclama é porque
quer algo em troca. Vivemos pela permuta social. Isso é natural. O que não é
natural é a incondicionalidade do gesto. Porque juntos construímos uma
sociedade. As formigas fazem o mesmo, e são bastante organizadas.
Eu tive um vizinho que certa
vez ficou furioso por ter dado comida a um mendigo e ele a recusou porque não
gostava de feijão. Nunca mais esqueci as palavras dele: “Ele não tem nada e
ainda quer escolher. Devia dar graças a Deus por conseguir alguém para lhe
oferecer comida.”.
Hoje entendo a chateação dele.
O que ele queria era agradecimento, ser correspondido, e, talvez, ser visto
pelos outros como o bom samaritano. Como ele acreditava que um mendigo não
podia ter escolhas, ficou revoltado. Se perguntassem a ele se o seu ato fora
solidário, ele certamente responderia afirmativamente.
Evidentemente que o nosso ego
se regozija com agradecimentos. Mas, o que queremos mesmo é contar com a ajuda
dos outros caso precisemos. O importante é ter em mente que as expectativas com
relação às ações alheias, sempre será um risco a frustrações.
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